quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Azul

Onde os ventos não são frios e onde o tempo não anda.
Existe um lugar pequeno e dedicado ao viver pleno do ócio que percorre segundos feito corrida de jabutis.
Escondido nos submundos do desconhecido, pairado sobre terra e mato. Não é fazenda ou chácara.
A estrada é branca e fofa, gotinhas frescas suspensas no ar. Muitas cores, mas muito azul.
É no céu que se desdobra lá em cima que o tempo parece desacelerar. 
De repente se levanta a menina que estava a contemplar. Tudo havia ficado azul, feito tinta, feito o mar.
As sombras desaparecem, o brilho é claro feito o sol que reflete e cega nos fazendo enxergar.
Tudo é claro, cheio de história e de ar. Sufoca quem lá está com tanto a respirar.
A menina tropeça em orquídeas sem se machucar. Dá risada, esquece até do luar.
Para ela já havia somente o azul do céu. Onde gostava de mergulhar.
Em uma caixa de sapatos velha, gastou todo lápis anil, e pintou a tampa. Fez a chuva, os animais, as casas, tudo com o seu azul. Não permitiria que azul fosse o céu se somente o azul existisse na aquarela. É perante todo arco-íris e infinitude de tons que o azul se torna especial, e a única cor que seria capaz de colorir tanto mistério sobre nossas cabeças.
Mas de uma coisa tinha a certeza: em toda sua loucura, seu coração era vermelho do sangue que a fazia amar, andar sem rumo e esperar, seja por tudo ou seja pelo nunca o nada.
Era a cor que a descrevia, que destacava seus traços no papel e na vida real. Não que tanto haja para distinguir, afinal, onde começa o sonho e encontramos o fato? E assim termina e começa a história da menina que pelo azul se apaixonou, e se encheu de cor, e invisível, por mais que queira, jamais um dia será.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Sonhando realidades

E se acaso dormisse
Acordasse lá
Em lembranças passadas
Perdidas nos subterrâneos do ser

Não parecia sonho. Ele estava na sala de espera do seu dentista, mas ele devia ter 14 anos. O mais estranho era que não parecia sonho. Ele havia ido dormir ontem, por volta de 23h, conversou com sua namorada, combinou que passaria no horário de almoço para vê-la. Não era sonho.

E ele que já tinha trinta
E pensava em se casar
Estava perdido e trancado
Num passado vivo

A secretária lhe chamou. Pediu para que entrasse, pois a Dra. Laura já iria atender. Lembra de como a achava bonita. Gostava de conversar com ele, saber como ia na escola. De repente o celular tocou. Ele tinha um celular, o mesmo velho, o primeiro a ganhar. Era sua mãe lhe avisando, que em seu retorno, em casa não iria estar.

Ao deixar o prédio imaginário
Andava em cimento real
O vento era triste e verdadeiro
Isso lhe deixava mal

Ele não sabia como acordar, tentava tropeçar. Avistou o jornaleiro amigo, que anotava o que pegava para que seu pai pagasse depois. De repente algo o assustou. Viu sua tia Rita, que morrera anos atrás. A tia o abraçou e perguntou de sua mãe. Ele, estático, falou, mesmo que mudo. Ao fim da conversa, nem sabia quando a tinha visto pela última vez, mas disse que sentia saudades. A tia lhe deu as costas sorrindo.

Uma dúvida pairava em seu ar
Estaria ele sonhando a adolescência
Ou era ainda tão jovem
E com trinta insistia em sonhar?

Resolveu entrar no clima. Mandou mensagem para o melhor amigo marcando alguma coisa. As ruas pareciam mais vazias. As pessoas não corriam como antes (ou depois?). Mas de repente tudo ficou azul. As almas que andavam não tinham face, os carros corriam sem rodas e as nuvens corriam sem céu.

Estaria fragmentando
Um sonho tão real
Que o fez sonhar de novo
Com a ceia de natal

E tudo ficou escuro e logo esclareceu. Acordava em sua cama, na casa da Avenida Três. Tinha os trinta anos de volta, e toda a vida. Estava assustado e não sabia o que havia acontecido. Talvez tenha sido o filme que assistiu. Foi quando se lembrou que não viu filme algum.

E por fim já não sabia
Se chorava ou se sorria
Pela realidade retomar
Perdendo a vida de antes
Presa pra sempre no passado
Livre no seu sonhar

sábado, 7 de julho de 2012

Outside

Fugiu do retiro psiquiátrico quando dona Carmem abriu os portões pra jogar o lixo. O vestido agarrou no latão, atrasando o retorno da monitora.
Saiu saltitante feito um animal descontrolado. Molhou os pés na lagoa, assobiou Mozart para um casal de namorados, deu tchau para uma criança e foi correspondido.
Na cidade viu motoristas se xingando, pessoas correndo, e nos jornais homens se matando. Deu risada. Parou na Cantina da Esquina e pediu um café. Estava bem arrumado pelas meninas do turno anterior. Camisa abotoada corretamente, sapato de camurça sem cadarço e calça marrom. Tomou o café vagarosamente, fingiu ler os jornais e pareceu interessado olhando pra TV. Estava ligada, mas é como se não estivesse.
Saiu, comprou livros, de Erasmo à Heminghway. Foi andando pelas ruas, se equilibrando em meios fios, até chegar na praça. Com frio, se encolheu enquanto lia. Não entendeu muita coisa do tal que falava de loucura. Andou mais.
Chegou aos limites da cidade. Pediu carona. Ganhou. Nunca mais se viu.
Foi viver a sua loucura, onde se encontram a maior parte daqueles que são como ele: do lado de fora.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Ponteiros

A camisa dele era uma daquelas listradas, entre o social e o esporte fino. Ela usava uma regata vermelha por cima de uma camiseta azul. Adora criar estilos. Estavam juntos havia alguns minutos, talvez uns 20. Ele queria se aproximar do cabelo dela, que cheirava maravilhosamente. Ela queria sentir a pele aquecida do braço dele, em uma sensação de segurança. Eles estavam conectados.
Ele logo precisava ir embora. A passagem já estava no bolso direito da calça, e ela preferia não se lembrar. Ainda haviam, sei lá, 15 minutos para ficarem ali, sentados naquele banco de pedra da rodoviária. Ele voltaria para sua rotina na cidade maior, e ela apenas iria seguir a dela na cidade pequena. O tempo voava tão depressa que parecia que pessoas adiantavam o relógio de algum lugar.
Eles não sabiam se estavam apaixonados. A única certeza de ambos era que estavam onde queriam estar. E que aquelas poucas centenas de segundos seria todo o motivo da saudade na hora seguinte.
Ele sempre prometeu voltar, e ele sempre volta. Ela promete que vai esperar, e sempre não vê a hora de chegar ao fim toda espera que conta, riscando os dias no calendário, na esperança de dormir e ver os dias correrem feito pássaros.
Cada instante longe do complemento é um dia lento, e cada minuto ao lado do que se completa o vento leva. E a vida segue sendo um apanhado de momentos, sonhos, e experiências rotineiras. Nem sempre se chora e nem sempre se pode sorrir. Mas o mais importante é sempre estar disposto a valorizar a oportunidade de poder esperar por alguém ou pelo sonho que um dia vem.

sexta-feira, 1 de junho de 2012

Coisa de destino

Tudo era normal até encontrar a loucura. Isso é fato consumado.
Passeava normalmente com sua roupa listrada e seu sorriso farto, livre.
Nem imaginaria o destino que estava prestes a lhe atacar. Algo ruim, surpreendente?
Não. A esquina.
Nem todo destino é ruim, ou precisa trazer mudanças radicais.
O passo seguinte do caminho para o trabalho se consuma como destino.
É o que vem depois, o que está além do agora, ou seja, é o segundo e século seguinte.
Poetizar é fácil. Difícil é se encontrar na poesia.
Ninguém espera por amores, vitórias e troféus.
Ninguém quer saber do destino. Esperar significa ter paciência.
Pessoas esperam a década seguinte, sem se ver no dia que nascerá.
A conta é simples e vai fazer chorar.
Viva seu dia, programe sua vida, mas nunca, a Deus dará.

sábado, 19 de maio de 2012

Aprendendo


Cada coisa merece um sentido específico. Nem sempre somos nós que podemos defini-los. O universo se encarrega de conceituar o que sentimos, o que enxergamos. A ciência prova que estão certos.
Desenvolvemos orgulho, percepção, consciência das coisas dos arredores, e o corpo se encarrega de cobrar os fardos. Ficamos ansiosos, receosos e tristes, sem saber o que se passa.
Porém quanto mais pararmos para compreender quem somos e o que fazemos aqui menos tempo teremos para viver histórias para um dia lembrar e contar.
Por mais que pareça que a vida não tem valor, quando assistimos o noticiário onde vemos 3, 5, 27 mortos. vidas se abreviam e nos importamos pouco. É natural. Lamentamos por 3 segundos vidas que cessaram e duraram 60 anos.
Os dias não passam lentos. Somos nós que somos ansiosos para que as coisas aconteçam logo, e uma hora parece durar um dia. Mas não adianta. Tudo tem seu tempo certo, e vem no momento que tem que vir. 
O mundo fala várias línguas mas todos se fazem entender em uma coisa: qualquer um quer ser feliz e tenta chegar nessa condição. E diferente da linguagem, isso não se aprende em nenhuma escola. Assim como não aprendemos falar inglês sem tentarmos, ninguém vai ser feliz repassando as lições de como ser infeliz.

sábado, 7 de abril de 2012

A importância do pensar, a obrigação do fazer

Tenho refletido bastante acerca de meios que nos fazem pensar, a nos encontrar em um mundo tão perdido. E essa reflexão me levou a fazer uma análise pessoal sobre os cursos oferecidos por universidades. Minha visão é bastante pessimista sobre estes.
Tudo deve se basear obviamente no gosto pessoal de cada um, nas vontades e desejos sobre o que se quer fazer da vida, do que se quer ocupar os dias. Mas, penso ser extremamente limitada a porção de mundo que cerca os cursos profissionalizantes, incluindo, e principalmente, os técnicos. Na verdade esta visão somente veio á tona pois refletia que apenas alguns cursos, apesar de também formar profissionais, tinham como base o objetivo de fazer o homem pensar, entender sua vida, a sociedade que o cerca. Incluo nesses cursos os de História, Psicologia, Ciências Sociais, Filosofia, e até mesmo os de Economia, Letras, Pedagogia, Física, Administração e Teologia.
Sei das distinções por área de interesse, entre Humanas, Exatas etc, mas me parece tão vago que pessoas se enfurnem em uma universidade por 3, 4 ou 5 anos para apenas aprenderem a fazer alguma coisa, coisa na qual farão (ou somente para estas estarão aptas) o resto de suas vidas. Exemplifico cursos como Ciências Contábeis, Educação Física e, principalmente, os que mais me incomodam, os cursos técnicos, como Gestão em Vendas, Financeira, Operador de tratores, Operador de empilhadeiras, entre tantos outros.
Cada pessoa possui a condição e necessidade especificas, mas é extremamente degradante, em minha opinião, que um ser humano deixe seu lar e vá estudar algo que irá aplicar somente no trabalho, tornando este trabalho como matriz única e maior de seus dias, se tornando basicamente uma máquina. O trabalho não deveria ser a motivação para as pessoas estudarem. Trabalho, quando não contempla os desejos do ser, deve ser tratado exclusivamente como forma de adquirir meios de sobrevivência, e não adquirir um status superior na rotina, já pobre e maçante, dos homens, principalmente dos de baixa renda.
A vida gira em torno, simplesmente, do ganhar mais para comprar mais, e se para isso precisa-se estudar formas de como trabalhar mais e com mais habilidade, que isso seja feito.
O mais degradante para o homem não é o trabalho em sí, mas sua privação do pensar, pois, como terão esses homens acesso a formas de pensamento e compreensão de sua existência?
Finalizando, a leitura exclusiva de autores específicos técnicos/profissionalizantes causa uma prisão mental, onde a chave se encontra nas páginas de pensadores que ampliam mundos, mostram outros horizontes, longe do trabalho, próximos do ser.